Surgido nos monastérios franceses ainda no século 12 e reintroduzido lentamente na Europa a partir de Napoleão Bonaparte, o tênis tem uma história tão rica como misteriosa. E certamente a contagem, dividida em partes de 15 em 15 que formam um 'game' e num grupo de seis games que agrupam um 'set', jamais foi suficientemente entendida pelos historiadores.
Para se ter uma ideia da antiguidade desse uso, o poema de Charles d´Orleans, datado de 1435, em que ele compara a vida a uma partida de tênis, o poeta se refere ao “45”, que era a expressão original do atual “40”. Outro indicativo está numa menção ao jogo entre o rei Philip de Castile e o Marquês de Dorset, ocorrido em 1505, em que o rei, por utilizar raquete, dava ao adversário um “handicap de 15”. Outra citação, agora em Latim, datada de 1522, relata a conversa de dois tenistas, em que um diz ao outro que “estamos vencendo por 30, estamos vencendo por 45”.
Esse formato de contagem intrigou Scaino da Salo, padre e doutor em Teologia, autor do primeiro livro que explicava o tênis, em 1555. O seu “Tratta del Giuoco della Palla”, que descrevia todos os jogos em moda, informava que se dava 15 pontos ao vencedor de cada jogada, numa sequência de 15, 30, 45. Ao se chegar aí, o jogador teria “a una”, ou seja, precisava de mais uma jogada; ou então “a due”, necessitando de duas jogadas. O primeiro termo é agora obsoleto, mas o outro foi preservado na França como “à deux” e adotado na Inglaterra como “deuce”, o que permanece até hoje. O termo “vantagem” também já existia.
Scaino acentua textualmente que, apesar de muita pesquisa, nenhuma literatura informava por que a contagem era dividida por 15. Aliás, o tênis não era o único esporte de então que utilizava o “15” como unidade.
Sua explicação pessoal era um tanto complexa, ainda que bastante lógica. Resumidamente, ele explicava a existência de três tipos de jogada: simples, dupla e tripla. A primeira quando os pontos eram vencidos alternadamente pelos dois lados; a dupla quando um jogador conseguia vencer quatro pontos consecutivos (ganhava um game de 0); e a tripla era quando ela tinha três pontos contra ele (hoje um 0-40) e conseguia ganhar cinco pontos seguidos para virar o placar, o que obviamente era considerado um feito espetacular. Por essa situação, os números 3 e 5 eram de fundamental importância. A unidade “15” teria sido então adotada por ser múltiplo comum tanto para o 3 como para o 5. Esta é a mais antiga teoria publicada para a contagem.
Nova hipótese
Exatos 24 anos depois, outra hipótese foi descrita por Jean Gosselin, autor do primeiro tratado em língua francesa sobre o tênis, do qual resta uma única cópia. Gosselin era nada menos que o bibliotecário-mor de quatro reis e deu origem à Biblioteca Nacional de Paris. As regras de então foram escritas por um tal Forbet, em 1592, e impressas em 1599. Gosselin dedicava grande parte de seu trabalho justamente ao mistério da contagem por “15”. Assim como Scaino, ele afirmava que tal sistema era antigo até mesmo naquela época.
Sua conclusão foi que o sistema se baseava na astronomia. Ele afirmava que a contagem foi certamente tirada de alguma forma já definida de medição e sugere que veio do sextante, que continha 60 graus, cada um deles dividido em 60 minutos e estes em 60 segundos. Assim, quatro vezes 15 fechava o game e quatro games faziam um set. E isso tem sua lógica: importante observar que os sets de então eram encerrados justamente com quatro games e não com seis, como acontece hoje. Ele ainda sugeria outra hipótese, que chamou de “geométrica”, tirada de uma figura chamada “clima”. Ela tinha 60 pés quadrados, ou seja, 4x15 pés.
Relógio ou moedas?
Em 1913, surgiu a interessante teoria do relógio. Tomando-se por base a divisão de 15 e o total de 60, os defensores viam claramente que isso obedecia a forma de medir as horas dos relógios antigos, sempre divididos em quartos de hora.
Vale ressaltar que o relógio foi uma invenção de extrema importância que surgiu na Era Medieval, a mesma dos primeiros jogos de tênis, por volta do século 13. No início do século 14, todas as catedrais possuíam um relógio moderno.
Por fim, em 1920, surgiu a teoria que agrada grande parte dos estudiosos, escrita por A. E. Crawley: a teoria da moeda. Ela explica que o sistema “sexagesimal” já era usado na antiga Babilônia e daí veio para a Europa e acabou adotado não apenas para determinar as partes da hora, mas principalmente como unidade monetária. A unidade então era o “60” e as frações eram a divisão do “60”, geralmente em quartos e metades. O tênis portanto usou esse sistema de dividir o todo em quatro partes, sendo o game a unidade.
A favor dessa linha existem ótimos argumentos. Sabe-se que as moedas francesas seguiam esse padrão entre 1310 e 1410, a tal ponto que as moedas de 60 sous podiam ser até cortadas em quatro partes, o que era considerado legal. Aliás, até mesmo antes de 1310, havia moedas de 15 sous, as chamadas “quinzains”.
O autor reforça a teoria ao lembrar que, desde seu início, o tênis era conhecido como um jogo de apostas em moeda. Havia verdadeiros códigos para explicar as apostas, que eram extremamente altas entre reis e nobres. A moeda mais valiosa de então era a moeda de prata, chamada de coroa, que valia... 60 sous. Estaria aí novamente a referência às quatro partes iguais de 15, que eram as quatro jogadas necessárias.
Para finalizar, Crawley cita ainda aquela contagem mencionada por Scaino, de simples (placar de 4/1 ou 4/2), duplos (placar de 4/0) e triplos (placar de 5/3) e afirma que a importância a esses tipos de situação só poderia ser justificada se os pontos valessem mesmo moedas.
*Trechos extraídos do livro "Entenda o Tênis", do próprio autor